quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

São Paulo na COP-10

Folha de São Paulo
Tendências e Debates
8 de dezembro de 2010

Pedro Ubiratan Escorel de Azevedo

O Estado tem posição de vanguarda nos governos subnacionais, destacando-se por projetos como as áreas de proteção ambiental marinhas
A atuante comitiva do Estado de São Paulo que integrou a delegação brasileira na 10ª Conferência das Partes (COP-10), que reuniu signatários da Convenção da Biodiversidade, em Nagoya (Japão), tem muito a contar sobre o que lá ocorreu.

Primeiramente, logramos aprovar um importante plano de ação para os governos subnacionais, que contribuirá para a proteção da vida na Terra.

A ideia de envolver os governos de Estados, províncias e cidades tomou força na COP-8, em Curitiba, em 2006, e consolidou-se com a Rede de Governos Regionais para o Desenvolvimento Sustentável, promovendo o fortalecimento de ações na proteção da biodiversidade.

Por esse caminho, chegamos a Nagoya com um plano de ação já delineado. São Paulo, copresidente da divisão Sul dessa rede, interveio perante o Itamaraty, colaborando para aperfeiçoar o texto inicial, e se articulou com outros interlocutores, entre eles a província de Quebec, no Canadá.

Os principais objetivos do plano são: aumentar o engajamento de autoridades regionais e locais na proteção, manejo e uso sustentável da biodiversidade; fortalecer a ação local; envolver a população em programas de proteção à natureza; e participar de uma coordenação global de defesa da biodiversidade.

Verificamos que São Paulo tem posição de vanguarda no conjunto dos governos subnacionais, destacando-se com projetos como o de pagamento por serviços ambientais, previsto na Política Estadual de Mudanças Climáticas, e o de implantação de três áreas de proteção ambiental (APAs) marinhas, que somam mais de 1,1 milhão de hectares em nossa costa.

Essas ações convergem para dois dos temas que estavam na ordem do dia dessa convenção.

O principal item do Protocolo de Nagoya aprovado durante a COP-10 orgulha o Estado, pois já temos cerca de 15% do território continental protegido por alguma categoria de unidade de conservação.

Dessas, 14,15% são estaduais e 0,85% são federais. No âmbito da proteção marinha, os parques estabelecidos nas ilhas oceânicas e as APAs costeiras perfazem 53% do mar territorial paulista. Com isso, as metas de Nagoya -17% da área continental e 10% da marinha- estão praticamente cumpridas.

É verdade que essa proteção precisa ser distribuída de forma equilibrada nos diferentes ecossistemas, mas podemos nos alegrar de ser o Estado com o maior contínuo de mata atlântica do país, na sua maior parte como reserva da biosfera da Unesco, compondo hoje um distinguido sítio do patrimônio mundial natural.

Atestei o enorme esforço conjunto para alcançar o protocolo tão almejado. Em tal cenário, atuamos na busca dos avanços e resultados positivos conhecidos.

São Paulo deu um passo para consolidar as responsabilidades inerentes às suas potencialidades e ao peso específico que possui na nossa Federação.


Pedro Ubiratan Escorel de Azevedo é procurador do Estado e secretário estadual do Meio Ambiente de São Paulo.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Justiça define novas metas

Valor Econômico
08/12/2010
Autor(es): Arthur Rosa | De São Paulo

Os 91 tribunais do país definiram ontem, durante o 4º Encontro Nacional do Judiciário, realizado no Rio de Janeiro, as metas para 2011, embora ainda não tenham alcançando os objetivos propostos para este ano. Balanço preliminar do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mostra que as Cortes cumpriram, em média, 50% das dez metas estabelecidas em fevereiro.

Os tribunais têm até o dia 17 de janeiro para atualizar os dados relativos às metas de 2010. O relatório final será divulgado em fevereiro, em novo encontro do Judiciário. O balanço parcial, no entanto, mostra que os objetivos traçados para a redução do acervo de processos não serão atingidos. A principal meta estabelecida pela Justiça, que determina o julgamento de 20% do estoque de execuções fiscais, não será cumprida. Em 2009, as execuções representaram quase um terço dos 86,6 milhões de processos em tramitação no país.

Para 2011, foram selecionadas quatro metas para todo o Judiciário e uma meta específica para cada esfera - trabalhista, federal, militar e eleitoral - com exceção da Justiça Estadual. Entre elas, uma que trata de responsabilidade social, que consiste na implantação de pelo menos um programa de esclarecimento ao público sobre as funções, atividades e órgãos do Poder Judiciário em escolas ou quaisquer espaços públicos. "A sociedade precisa confiar na Justiça e não podemos permitir que seja distorcida a imagem do Judiciário", afirmou o presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, ao ressaltar a importância dessa meta.

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Poucos tribunais cumpriram a meta das execuções fiscais

 Valor Econômico
 07/12/2010
Autor(es): Arthur Rosa

Tributário: Proposta do Poder Judiciário era julgar pelo menos 20% do estoque de processos.

A maioria dos tribunais brasileiros não vai conseguir cumprir a principal meta estabelecida pelo Judiciário para este ano: julgar 20% do acervo de execuções fiscais que, em 2009, representaram quase um terço dos 86,6 milhões de processos em tramitação no país. Apesar de haver mecanismos para buscar bens de devedores - penhoras de dinheiro, imóvel e veículo -, os juízes conseguiram reduzir em apenas 8,9% o estoque acumulado de ações. Apenas 12 Cortes - cinco estaduais, quatro trabalhistas e três eleitorais - alcançaram o objetivo.

Um balanço preliminar das dez metas estabelecidas pelos 91 tribunais brasileiros para este ano será divulgado hoje, durante o 4º Encontro Nacional do Judiciário, realizado no Rio de Janeiro. No evento, também serão definidos os objetivos para o próximo ano. A meta 3 - que inclui, além das execuções fiscais, a redução de pelo menos 10% do acervo de processos na fase de cumprimento - foi considerada a mais ousada pelos magistrados, que não conseguirão cumpri-la. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), apenas 3,8 milhões de execuções foram baixadas até novembro - 69,7% da meta.

Em relação às execuções fiscais, apenas 44,5% da meta foi cumprida. Nenhum dos cinco tribunais regionais federais conseguiu finalizar a quantidade necessária de processos. "É um procedimento difícil, que depende das partes, credor e devedor, para ser cumprido", justifica o secretário geral-adjunto do CNJ, José Guilherme Vasi Werner. Este ano, segundo ele, o órgão criou um grupo de trabalho para discutir ações necessárias ao cumprimento da meta 3, o que resolveria um dos principais gargalos da Justiça brasileira. "Mas todas as soluções envolviam projetos de lei ou a colaboração do Estado."

O CNJ conseguiu, no entanto, enviar à Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) uma lista com cerca de 300 mil execuções fiscais que poderiam ser finalizadas. Um CD com os números dos processos foi encaminhado em outubro. A PGFN iniciou no ano passado um trabalho de qualificação dos cerca de R$ 800 bilhões da dívida ativa da União. Foi criado um grupo de trabalho envolvendo procuradores de diversos Estados para analisar os créditos e ver quanto realmente ainda pode ser cobrado. O órgão também quer terceirizar a cobrança dos créditos de até R$ 10 mil. Até esse montante, os procuradores estão desobrigados por lei de propor ações de execução fiscal para cobrar o débito. Isso porque o custo para a cobrança não cobre o gasto do processo. Em média, uma ação de execução custa à Fazenda RS 13 mil.

Hoje, menos de 1% do estoque da dívida ativa da União ingressa nos cofres públicos a cada ano. O processo de execução fiscal no Brasil é moroso, caro e de baixa eficiência. Na Justiça Federal, uma ação demora, em média, 12 anos para ser concluída, sem contar quatro anos iniciais da fase administrativa. De acordo com o relatório Justiça em Números 2009, divulgado pelo CNJ, enquanto a taxa de congestionamento geral foi de 69%, nos processos de execução fiscal esse valor sobe para 90%, uma diferença de 21 pontos percentuais.

Para mudar a situação, as apostas do Judiciário estão nos Juizados Especiais da Fazenda Pública, instituídos pela Lei Federal nº12.153, de 2009, e em projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional para alterar a execução fiscal no país. Os projetos, que começaram a ser analisados em abril, preveem uma modificação radical no modelo de cobrança tributária no país, fazendo com que boa parte das fases da execução que hoje ocorrem na Justiça - como a intimação do devedor e a localização de bens para penhora - migre para o âmbito administrativo das fazendas públicas. "Esperamos que a Lei de Execuções Fiscais (nº 6.830) seja reformada o quanto antes. Ela é de 1980", diz o advogado e professor Heleno Torres, que acompanha a tramitação dos projetos. "Precisamos de um sistema de cobrança mais célere e eficiente."

OAB cobra de tribunal pagamento de precatórios

Folha de S. Paulo
Mercado Aberto
7/12/2010

A OAB-SP entregou na semana passada ao TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) um pedido para que os pagamentos de precatórios para idosos e doentes graves sejam feitos imediatamente.

O tribunal já tem à disposição cerca de R$ 1,5 bilhão em depósitos feitos pelo governo do Estado. Porém apenas R$ 4 milhões foram pagos.

O atraso foi provocado por uma mudança trazida pela Emenda Constitucional 62, de dezembro de 2009, que torna o tribunal responsável por efetivar os pagamentos. Antes, a função era do próprio órgão devedor.

Na transição, o tribunal precisou contratar, por licitação, uma empresa de informática para elaborar um programa que define as prioridades dos pagamentos.

"Não temos interesse em manter o dinheiro. Temos compromisso com a cronologia. Corremos contra o tempo, contratamos o software para isso", diz o desembargador Venício Salles, do TJ-SP. Segundo ele, a primeira etapa do software foi concluída.

O pedido da OAB é que doentes e idosos sejam atendidos independentemente da elaboração completa da lista de preferências.

Esse primeiro pedido tem peso político, mas o próximo passo, segundo a entidade, é levar o caso ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça).

"Se não tomarem providência, podemos tecnicamente pedir responsabilização civil", diz Flávio Brando, presidente da comissão de precatórios da OAB nacional.

"Se forem ao CNJ e vierem com uma fórmula boa, que não envolva a transgressão de outros direitos, aceitaremos", diz o desembargador.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Resolução do CNJ é questionada no Supremo

Valor Econômico
06/12/2010
Autor(es): Adriana Aguiar | De São Paulo

A ofensiva do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aos devedores de precatórios causou reação do governo do Estado do Pará, que não concorda com o pagamento dos títulos sob as novas regras. A Procuradoria-Geral do Estado entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra a Resolução nº 115 do CNJ, de junho deste ano. A norma regulamentou o pagamento dos títulos atrasados.
Por meio da resolução, que sofreu algumas alterações em outubro, o CNJ pressionou os inadimplentes a quitar suas dívidas em 15 anos, independentemente do regime de pagamento escolhido. E impôs aos devedores, que optaram por parcelas anuais, o depósito de pelo menos o valor correspondente ao pago em 2008. O Estado do Pará entrou com a Adin nº 4.465 para questionar o limite mínimo das parcelas a serem recolhidas.

Como essas regras não estão dispostas na Emenda Constitucional (EC) nº 62, de dezembro de 2009, - que alterou a forma de pagamento desses títulos - o Pará resolveu questionar a resolução do CNJ. O Estado, ao seguir a redação literal dada pela emenda, passou a pagar muito menos de precatório. Em 2008, antes da EC 62, depositou R$ 21,4 milhões, segundo dados da Procuradoria-Geral do Estado na inicial. Este ano, com a nova emenda, deveria depositar apenas R$ 6,2 milhões. Com a resolução do CNJ, no entanto, o Estado deve pagar pelo menos o mesmo valor de 2008.

A determinação do CNJ, no entanto, seria inconstitucional para a Procuradoria do Estado do Pará, ao violar o inciso II do artigo 5º da Constituição, que prevê que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei". Assim, argumenta que há diversos precedentes nesse sentido em julgamentos de outros temas no Supremo.

Para o Pará, conforme a inicial, "o Conselho Nacional de Justiça jamais poderia legislar, quando deveria apenas regulamentar". O Estado também argumenta que "o dispositivo questionado cria na realidade uma terceira hipótese" de pagamento não prevista na Constituição, que reduziria o prazo de 15 anos, dado pela Emenda 62, para um período menor. A dívida estimada do Estado é de cerca de R$ 85 milhões. Se fosse depositado cerca de R$ 20 milhões por ano, como ocorreu em 2008, a dívida seria quitada em um pouco mais de quatro anos.

Na visão do CNJ, os devedores que têm condições financeiras de pagar o que devem antes dos 15 anos, devem fazê-lo, de acordo com o conselheiro do CNJ, Ives Gandra Martins Filho. "Até porque muitos credores são idosos e portadores de doenças graves que não podem mais esperar", diz. Segundo Gandra, a interpretação que o Conselho deu à Emenda 62 foi justamente para torná-la viável. "Caso contrário, a própria emenda teria que ser considerada inconstitucional, por violar princípios como o da dignidade humana, ao protelar o pagamento de credores."

Esses argumentos embasam ações contra a própria Emenda 62 no Supremo, que ainda serão analisadas. "Se a emenda cair, volta ao regime comum. E os devedores terão que quitar tudo de uma vez só, na mesma hora", afirma Gandra. Porém, enquanto a Emenda 62 estiver em vigor, "não podemos fazer com que ela seja um terceiro calote constitucional no pagamento de precatórios."

A ação foi distribuída no dia 17 de setembro para o ministro Marco Aurélio. Diante do pedido de liminar, no mesmo dia o ministro decidiu que deveria aguardar o julgamento definitivo em razão da relevância tema. O Estado de Santa Catarina, a Associação Brasileira de Aposentados e Pensionistas e o Sindicato dos Funcionários do Judiciário da Grande Belém e Região Nordeste do Pará (Sindjubrn) já pediram para entrar como partes interessadas na ação. O julgamento, porém, ainda não tem data para ocorrer.

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também deve entrar com o pedido de amicus curiae (amigo da Corte) para participar da ação. Segundo o presidente da entidade, Ophir Cavalcante, é "lamentável a postura do Estado do Pará, que sempre se autoelogiou por pagar precatórios em dia e que, agora, deseja ver referendado o calote contra os credores do Estado ao alongar indefinidamente a dívida". Para o presidente da Comissão Especial de Defesa dos Credores Públicos (Precatórios) da OAB, Flávio Brando, essa ação será um "tiro no pé dos devedores, já que demonstra claramente que o Estado não quer pagar esses títulos em prazo algum". Brando afirma também que o Supremo já sinalizou, ao analisar a Emenda Constitucional nº 30, que estava em vigor até 2009, que essas moratórias são inconstitucionais e que as coisas julgadas têm que ser respeitadas. Procurador pelo Valor, o procurador-geral do Pará, Ibraim José das Mercês Rocha, não retornou até o fechamento da edição.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Estado não pode mais regulamentar telecomunicações

Valor Econômico 
03/12/2010
Autor(es): Juliano Basile | De Brasília

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, ontem, que os Estados não podem regulamentar telecomunicações. Apenas a União teria esse poder. Os ministros julgaram uma ação direta de inconstitucionalidade que foi proposta pelo governo do Distrito Federal contra uma lei aprovada, em 2004, pela Câmara Distrital. A lei obrigou as companhias telefônicas a colocar a data, o horário e a duração das ligações nas contas dos consumidores. Além disso, as operadoras precisavam identificar o número chamado, a quantidade de pulsos por mês e a média dos últimos seis meses.

Ao fim de uma breve discussão, foi decidido, por nove votos a um, que a lei da Câmara Distrital é inconstitucional, pois apenas a União poderia legislar sobre telecomunicações. O ministro Carlos Ayres Britto ficou vencido.

"Esse foi o primeiro julgamento em que se definiu essa tese e terá repercussão para outros casos", afirmou a advogada Daniela Teixeira, do escritório Wald & Associados, que defendeu a Brasil Telecom. Ela acredita que a decisão vai servir como precedente para outros processos em que Estados aprovaram leis para regulamentar o serviço de telecomunicações.

Um deles é a definição sobre a cobrança de assinatura básica pelas companhias do setor.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

STJ veda compensação de tributos quando Fazenda pode recorrer

Valor Econômico
29/11/2010
Autor(es): Laura Ignacio | De São Paulo

A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu vedar a compensação de créditos ainda que o Supremo Tribunal Federal (STF) já tenha declarado o imposto indevidamente recolhido inconstitucional. É o caso do Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural), por exemplo. Em fevereiro, o Supremo declarou a inconstitucionalidade da contribuição ao fundo no processo movido pelo Frigorífico Mataboi. Com base nessa decisão, vários contribuintes foram ao Judiciário e conseguiram permissão para usar créditos do Funrural para pagar outros tributos federais. Agora, como o STJ decidiu em sede de recurso repetitivo - orientando como os demais tribunais e varas devem decidir - , isso não deve mais ocorrer. O processo de cada contribuinte deverá tramitar até não caber mais recurso, o que pode levar anos.

Por unanimidade, os ministros da Corte balizaram sua decisão no Código Tributário Nacional (CTN), que determina que "é vedada a compensação mediante o aproveitamento de tributo, objeto de contestação judicial pelo sujeito passivo, antes do trânsito em julgado da respectiva decisão judicial". No caso, o Tribunal Regional Federal (TRF) da 1ª Região havia acolhido o pedido de uma empresa de moda em couro do Distrito Federal, definindo prazo para a compensação e índices de correção monetária a serem observados.

Como o resultado final do processo é previamente conhecido, em razão da decisão do STF, não seria necessário esperar o trâmite até o fim. Esse é o posicionamento do advogado Renato Nunes, do escritório Nunes, Sawaya, Nusman & Thevenard Advogados. "Contrário ao entendimento do STJ, esse posicionamento vinha sendo aceito em tribunais como o TRF da 3ª Região, em São Paulo", afirma o advogado. Em outubro, por exemplo, ao julgar processo sobre o alargamento da base de cálculo do PIS e da Cofins, os desembargadores da 3ª Região decidiram que não seria necessário exigir que o processo tramitasse até o fim. Isso em razão da decisão do Supremo que decidiu pela inconstitucionalidade do parágrafo 1º do artigo 3º da Lei nº 9.718, de 1998, no sentido de que a base de cálculo das contribuições seria equivalente à "totalidade das receitas auferidas".

A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) informou que, por se tratar de matéria infraconstitucional, não cabe recurso extraordinário ao Supremo, devendo prevalecer a posição do STJ, favorável à procuradoria. "A PGFN é pela aplicação do CTN, que condiciona a compensação tributária ao trânsito em julgado", declarou em nota. Sobre o impacto da decisão, o setor informou que é impossível dimensionar o valor, pois, no caso, são todas as ações judiciais que têm como pedido a compensação.

As empresas que já conseguiram decisões favoráveis à compensação, proferidas por tribunais regionais ou varas federais, podem sofrer impacto com a decisão. As cooperativas paranaenses Batavo, Castrolanda e Capal, por exemplo, conseguiram suspender no TRF da 4ª Região (Sul) a cobrança da contribuição ao Funrural, com base na decisão do Supremo em relação ao Frigorífico Mataboi. Na prática, elas só não serão afetadas porque não fizeram a compensação, seguindo orientação do advogado James Marins, do escritório Marins Bertoldi Advogados Associados. "Como o Supremo reconheceu a inconstitucionalidade em ação individual e a decisão do TRF se baseou nela, aconselhamos a empresa a manter o depósito judicial até o fim do processo", diz.

A advogada Priscila Faricelli de Mendonça, do Trench, Rossi e Watanabe Advogados, afirma que pede o afastamento da aplicação do CTN quando há decisão do Supremo pela inconstitucionalidade. Ela afirma possuir decisões pelas quais o juiz libera a compensação. "Porém, como a recente decisão do STJ vai orientar os tribunais do país inteiro, o depósito do valor em discussão em juízo, enquanto ainda couber recurso, passa a ser essencial", afirma.

A Justiça e o setor de saúde

O Estado de S. Paulo
28/11/2010
Editorial

Os processos judiciais que questionam decisões do poder público em matéria de saúde tiveram um crescimento vertiginoso nos últimos anos. Eles eram pouco significativos, na década anterior, mas um levantamento que vem sendo realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) constatou que hoje tramitam mais de 112 mil ações desse tipo em 20 dos 91 tribunais brasileiros.

Os técnicos do CNJ estimam que, quando concluírem o exame dos dados dos 71 tribunais que ainda não foram pesquisados, o número de ações judiciais relativas a questões de saúde ficará em torno de 500 mil. Na esfera estadual, o Tribunal de Justiça de São Paulo é o mais demandado do País nesse tipo de litígio, com 44,6 mil ações, seguido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, com mais de 25 mil processos.

Esses litígios começaram a proliferar nos tribunais após a promulgação da Constituição de 88, que assegurou a todos os brasileiros o direito universal e integral à saúde - inclusive assistência farmacêutica. Até então, o atendimento gratuito só era garantido aos que contribuíam com a Previdência Social e a rede pública praticamente não distribuía medicamentos gratuitos. Com a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), as autoridades do setor prepararam as listas de remédios a serem distribuídos de graça aos segmentos mais pobres da população. Mas, apoiados pelo Ministério Público e as Defensorias Públicas, pacientes de classe média passaram a obter na Justiça liminares que obrigam o SUS a fornecer também remédios de última geração para doenças específicas e de tratamento prolongado, como aids e esclerose múltipla.

Desde então, as autoridades municipais, estaduais e federais de Saúde fazem duras criticas ao que consideram a "judicialização" do setor. Segundo elas, os remédios pedidos por promotores e defensores públicos em nome de pacientes são caros e o mercado dispõe de similares mais baratos. O Ministério da Saúde também alega que vários medicamentos cuja distribuição tem sido imposta por liminares teriam duvidosa eficácia terapêutica. Para as Secretarias Municipais e Estaduais da Saúde, as ações que pedem medicamentos e atendimento médico fora das listas e procedimentos médicos do SUS estariam comprometendo o planejamento e até as finanças dos Estados e municípios. Só em São Paulo, a Secretaria da Saúde gasta mais de R$ 300 milhões por ano para cumprir liminares - o valor é equivalente ao custo de construção de seis hospitais de porte médio.

A principal crítica das autoridades de saúde é relativa ao desconhecimento da Justiça nessa matéria. Alegam que, por não ter formação técnica, os juízes estariam tomando decisões equivocadas e com alto custo para os cofres públicos.
Depois de muita discussão, inclusive no âmbito do Supremo Tribunal Federal - que há dois anos reconheceu a "repercussão geral" do tema, em razão de suas implicações econômicas e jurídicas -, finalmente prevaleceu o bom senso. Numa iniciativa oportuna, o CNJ está recomendando à Justiça Federal e às Justiças estaduais a criação de equipes técnicas - integradas por médicos e farmacêuticos - para auxiliar os juízes nas tomadas de decisões. A experiência está sendo feita com grande sucesso nos Tribunais de Justiça do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul. Nas duas Cortes, as equipes já emitiram mais de 2 mil pareceres, gastando em média 48 horas para produzir um laudo técnico, o que resultou em decisões mais precisas por parte dos juízes.

Além dessa medida, o CNJ realizou na semana passada o Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde, com a presença de juízes, promotores, defensores públicos e representantes do Executivo, agências reguladoras e até de empresas de seguros de saúde. O encontro teve por objetivo discutir alternativas para a resolução dos conflitos judiciais existentes no setor e terminou com o compromisso de todos os Poderes de trocar informações com regularidade. Iniciativas sensatas e oportunas como essas são decisivas para melhorar a eficiência de um setor que há muito tempo está à espera de profundas reformas.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

STF dá aval para Receita acessar sigilo de investigados

O Estado de S. Paulo 
26/11/2010
Autor(es): MARIÂNGELA GALLUCCI

BRASÍLIA - O Supremo Tribunal Federal (STF) deu o aval para que a Receita Federal tenha acesso ao sigilo bancário de contribuintes investigados sem prévia autorização judicial. Por 6 votos a 4, os ministros do STF derrubaram uma liminar que tinha sido concedida em 2003 a uma empresa do Paraná ameaçada de ter o seu sigilo quebrado pelo Fisco. A maioria dos ministros reconheceu a validade de uma legislação de 2001 que garante à Receita o direito de ter acesso aos dados bancários.


O ministro Carlos Ayres Britto disse que, assim como as Comissões Parlamentares de Inquérito (CPIs), a Receita Federal é um órgão de controle e deve poder ter os dados rapidamente e sem necessidade de autorização judicial. De acordo com Ayres Britto, o que não pode ocorrer é o vazamento dos dados.

Segundo o ministro Dias Toffoli, o que ocorre é uma transferência de dados sigilosos de um portador para outro, que tem o dever de manter em sigilo as informações. "A eventual divulgação desses dados fará incidir o tipo penal e permitirá inclusive a responsabilização até civil, administrativa, enfim, todas as responsabilizações previstas em lei", afirmou.

Contrário à tese vencedora, o relator do caso no Supremo, ministro Marco Aurélio Mello, concedeu uma liminar em julho de 2003 beneficiando a empresa GVA Indústria e Comércio S/A. Para ele e outros três integrantes do STF, o sigilo bancário somente pode ser quebrado após autorização do Judiciário, já que a Constituição Federal garante a inviolabilidade da intimidade e da vida privada e o sigilo dos dados.

"A quebra do sigilo bancário não pode e não deve ser utilizada como instrumento de devassa indiscriminada das contas mantidas em instituições financeiras. Basta que a administração tributária fundamente sua intenção de ruptura do sigilo bancário e submeta o seu pleito ao Judiciário", afirmou o decano do Supremo, ministro Celso de Mello, que também se posicionou contra a quebra automática de sigilo.

Para os ministros do STF, a decisão abre precedente para que outras polêmicas quebras de sigilo, pelo Ministério Público e por tribunais de Contas, também recebam o aval do Poder Judiciário.

CNJ cria pente-fino para processos parados

O Globo 
26/11/2010
Autor(es): Agencia o Globo/Jailton de Carvalho


Comissão especial tentará agilizar casos de grande repercussão, como ação por improbidade contra o prefeito Zito

Numa tentativa de coibir a impunidade no país, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu criar uma comissão especial para monitorar a tramitação de 200 processos judiciais de forte repercussão social que, por diversos motivos, estão parados na prateleira de alguma vara cível ou criminal. Entre os alvos do CNJ, está uma ação por improbidade administrativa contra o prefeito José Camilo Zito, de Duque de Caxias.

Segundo informações repassadas pelo Ministério Público Estadual ao CNJ, a Justiça local demorou mais de seis anos para notificar o prefeito à apresentar defesa prévia. Um dos promotores que está à frente do levantamento entende que a citação do réu poderia ter demorado, no máximo, um mês.

Mansões irregulares na Gávea podem virar alvo

Zito é um político conhecido e, para ser encontrado, bastaria uma consulta à agenda diária do prefeito. Na ação, ele foi denunciado de desviar dinheiro das obras de despoluição da Baía da Guanabara. Outros políticos, servidores públicos e empresários também são acusados pelas supostas irregularidades.

O monitoramento do Conselho Nacional poderá resultar também no despejo e demolição de mansões numa terreno irregular da Gávea, no Rio de Janeiro. As mansões foram construídas numa área de preservação ambiental, conforme denúncia do Ministério Público Estadual. O processo está na fase final. Mas, quase duas décadas depois de tramitação, a ordem de despejo ainda não foi cumprida. Entre os donos das mansões estariam políticos, profissionais liberais famosos e celebridades.

A comissão especial, encarregada do monitoramento, é presidida pela ministra Eliana Calmon, corregedora nacional de Justiça. Segundo ela, a ideia é acompanhar a tramitação dos processos e descobrir por que estão sem solução. Ela argumenta que, em muitos casos, os juízes esbarram em dificuldades que vão da falta de peritos a problemas de ordem política. A partir daí, a comissão poderá tomar providências para ajudar os juízes a concluir os processos, principalmente aqueles que atingem grande número de pessoas ou envolvem somas expressivas de recursos públicos.

- É um projeto que agrada até a alguns juízes - disse a corregedora.


A sugestão de fazer uma operação pente-fino sobre processos de grande impacto que estão parados teve origem num pedido da Secretaria Nacional de Direitos Humanos. Preocupados com a possível punição do Brasil pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos), representantes da secretaria pediram a intervenção do Conselho Nacional em alguns casos de processos de tramitação excessivamente lenta.

Comissão começará a acompanhar cem processos

A ministra Eliana Calmon concordou com o pedido e decidiu estender a fiscalização a pelo menos 200 casos.

Num primeiro momento, a comissão se dedicará ao acompanhamento de cem processos. Na etapa seguinte, o foco será direcionado a mais cem. Entre os casos de repercussão internacional está o processo relacionado ao assassinato do sindicalista José Dutra, conhecido como Dezinho. Ele foi assassinado em novembro de 2000, no município de Rondon do Pará (PA), em decorrência de uma disputa de terras na região e, até hoje, os assassinos não foram punidos. O caso já foi levado até à OEA.

- Ninguém vai interferir na liberdade do juiz julgar. O que não podemos admitir é que um processo, de grande repercussão social, não tenha a devida tramitação - disse o corregedor nacional do Ministério Público, Sandro José Neis.

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Receita poderá quebrar sigilo bancário

Valor Econômico 
25/11/2010
Autor(es): Juliano Basile | De Brasília

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, ontem, que a Receita Federal pode quebrar o sigilo bancário de empresas sob investigação, sem autorização da Justiça. A decisão foi uma vitória das entidades que promovem investigações de crimes financeiros, como a Receita, o Ministério Público, o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Polícia Federal. Do outro lado, as empresas que respondem a processos envolvendo as suas movimentações bancárias foram as grandes derrotadas.

O STF julgou o pedido de uma empresa - a GVA Indústria e Comércio. Ela obteve liminar, em julho de 2003, para impedir a Receita de utilizar seus extratos bancários. O Fisco pediu os extratos ao Banco Santander, que informou à GVA que iria fornecê-los.

A liminar foi concedida pelo ministro Marco Aurélio Mello, relator do processo. Ontem, ele levou o caso para a votação pelos demais ministros do STF.

O caso dividiu o STF. De um lado, seis ministros (Joaquim Barbosa, Carlos Ayres Britto, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Carmen Lúcia Antunes Rocha e Ellen Gracie) entenderam que a liminar deveria ser cassada. Eles ressaltaram que, quando um banco envia dados para a Receita, não há quebra de sigilo, mas sim, a transferência para o Fisco do dever de manter esses dados protegidos do público.

"Os dados ou informações passam da instituição financeira ao Fisco, mantendo-se o sigilo que os preserva do conhecimento público", afirmou Ellen Gracie. De outro, quatro ministros (Marco Aurélio, Cezar Peluso, Ricardo Lewandowksi e Celso de Mello) concluíram a liminar deveria ser mantida, pois apenas com autorização da Justiça é que seria possível a quebra de sigilo bancário.

"Com a revolução tecnológica, os papéis se transformaram em dados. É uma época em que a informação é poder. Isso exige maior proteção às pessoas para que elas não fiquem sob contínua exposição ao governo", disse Celso de Mello. Ele advertiu ainda que as empresas podem e devem recorrer ao Judiciário sempre que tiverem o sigilo quebrado por órgãos governamentais. "A decretação da quebra de sigilo não pode converter-se num instrumento de devassa indiscriminada nas contas submetidas a instituições financeiras", afirmou Celso. "As pessoas jurídicas podem invocar a tutela jurídica da intimidade, opondo-se à pretensão do Estado (de quebrar o sigilo bancário)", completou.

STF livra governo de ação trabalhista

Correio Braziliense 
25/11/2010
Autor(es): Cristiane Bonfanti

O Supremo Tribunal Federal (STF) desobrigou União, estados e municípios de arcarem com custos trabalhistas que não são pagos por empresas terceirizadas. Hoje, há uma demanda na Justiça do Trabalho intensa de pessoas que são contratadas para atuar no governo. A administração pública pagas as empresas, mas elas não repassam o dinheiro aos trabalhodores e, muitas vezes, fecham as portas e desaparecem.

Na decisão de ontem, o STF confirmou a constitucionalidade do artigo 71 da Lei nº 8.666/1993, a famosa Lei das Licitações. A norma retira a responsabilidade do governo de pagar os encargos trabalhistas não quitados por instituições terceirizadas. A alegação do autor da ação, o governo do Distrito Federal, era de que a lei teria sofrido retaliações por parte dos órgãos do Poder Judiciário. Baseados na súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) — segundo a qual a administração pública é responsável no caso de inadimplência —, eles começaram a jogar as despesas na conta do tesouro.

Relator da ação, o ministro Cezar Peluso ressaltou que, mesmo com o entendimento do STF, os tribunais continuarão analisando os casos. “Considero a norma constitucional, o que não impedirá que a Justiça reconheça a responsabilidade da administração com base nos fatos”, disse Peluso.

Na avaliação da advogada trabalhista Larissa Chaul de Carvalho Oliveira, do escritório Alino & Roberto e Advogados, a decisão do STF restringe as possibilidades de conquista por parte dos trabalhadores. “Ainda não temos acesso ao voto dos ministros. Mas, a princípio, vai ficar mais difícil para os funcionários. Eles terão de provar a culpa do governo”, explicou. Segundo ela, os tribunais terão de analisar se o governo não fiscalizou o cumprimento do contrato ou se falhou na hora da licitação, ao não seguir critérios rígidos de escolha das empresas. “Mas temos de esperar para ver as consequências da decisão, até porque ainda cabe recurso. Vamos saber, por exemplo, se o TST vai revisar súmulas”, observou.

Se, por um lado, advogados trabalhistas avaliam negativamente o entendimento do STF, por outro, o governo comemora. “É uma ação pioneira da Procuradoria-Geral do DF e interessa a todo o Brasil, pois representa economia de milhões aos cofres públicos”, destacou a procuradora-geral adjunta do DF, Simone Lucindo. Segundo ela, de 2006 até hoje, o Distrito Federal foi condenado a pagar dívidas de empresas terceirizadas em mais de 4 mil ações. Entre os casos está o do Instituto Candango de Solidariedade (ICS). “Não é justo o Estado pagar duas vezes. No fim das contas, é a população que arca com os custos”, disse.

A ação referente aos encargos trabalhistas começou a ser votada em setembro de 2008, mas teve o julgamento suspenso por um pedido de vista do ministro Carlos Alberto Menezes Direito (falecido).

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

CNJ quer acelerar julgamentos sobre casos de direitos humanos

Valor Econômico 
24/11/2010
Autor(es): Juliano Basile | De Brasília

O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lançou ontem um programa para acelerar o julgamento de processos de grande repercussão social e internacional. O objetivo é evitar que casos que se arrastam há décadas no Judiciário levem o Brasil a sofrer denúncias em Cortes internacionais de direitos humanos.
"Detectamos que existem processos que há muito tempo aguardam solução", afirmou a corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon. Ela citou o caso de Roselândio Borges Serrano, que ficou tetraplégico após ser baleado por policiais militares, na favela de Peixinhos, perto de Olinda, em Pernambuco. O processo estava parado desde 1997, esperando para ver se a competência para julgar seria da Justiça Comum ou Militar. Bastou um ofício da corregedoria e, em menos de um mês, houve uma decisão.

O Brasil foi denunciado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) por casos desse tipo, para os quais a Justiça praticamente não funciona. Um exemplo é o assassinato do sindicalista José Dutra, em novembro de 2000, em Rondon, no Pará, decorrente de conflitos agrários na região. Ou ainda de Damião Ximenes Lopes, morto numa casa de repouso psiquiátrico, em Sobral, no Ceará, em 1999, após episódios de tortura.

"Nós percebemos que muitos processos estavam paralisados por inação, descaso, exigência de realização de perícia, por diversas ordens", disse Eliana. "Nós temos que funcionar como uma empresa privada que trabalha pelo lucro. O nosso lucro é a solução dos processos de maneira rápida", afirmou. Pelo programa, batizado de "Justiça Plena", 200 processos serão monitorados para que não caiam num limbo judicial, e no qual nenhuma decisão é tomada. No primeiro ano, o monitoramento será de cem casos.

Para o secretário especial de Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi, o sistema de proteção internacional de direitos humanos é robusto e o Brasil não pode permitir que denúncias de violações a esses direitos fiquem sem solução na Justiça.

O ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, afirmou que o programa vai permitir a solução para "casos que intrigam o estado brasileiro". Além de violações a direitos humanos, o programa vai atuar em ações de improbidade, como denúncias de crimes cometidos por políticos.

A Justiça tarda e falha

Correio Braziliense - 24/11/2010

Nas Entrelinhas
Autor(es): Lúcio Vaz

Pior do que a demora no julgamento é quando a Justiça não chega a uma decisão. Primeiro, porque um inocente pode ser injustamente acusado. Segundo, porque um bandido pode estar à solta

Um detalhe chama sempre a atenção nas notícias sobre condenação de políticos: o tempo decorrido entre o ato praticado e a decisão da Justiça. Além disso, muitas vezes, trata-se apenas de uma sentença em primeira instância. Até se chegar a uma decisão irrecorrível, quando o processo foi transitado em julgado, podem passar mais alguns anos. O último contemplado com sentença de primeira instância foi o deputado Paulinho da Força (PDT-SP), condenado por improbidade administrativa por assinar convênios irregulares com verbas do Fundo de Amparo do Trabalhador (FAT) em 2001. Já se passaram nove anos. O Tribunal de Contas da União (TCU) apontou as ilegalidades e mandou suspender os repasses em 2003. Depois disso, ele foi eleito deputado federal, em 2006, e cumpriu integralmente o mandato, até ser reeleito nas eleições deste ano. Antes disso, em 2008, tornou-se suspeito de envolvimento num caso de desvio de recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), num processo ainda não concluído.

O ex-governador de Alagoas Ronaldo Lessa (PDT) recebeu condenação definitiva do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Vai ter que pagar R$ 300 mil de indenização a um desembargador de Alagoas por calúnia e injúria. O desembargador foi chamado de “ladrão desavergonhado” em janeiro de 2001, quando Lessa ainda era governador. Pelo menos, não há mais recursos, mas já se passaram nove anos do momento da acusação. O ex-governador tentou, sem sucesso, voltar ao cargo de governador nas eleições deste ano.

Pior do que a demora no julgamento é quando a Justiça não chega a uma decisão, mesmo passados anos da denúncia. Primeiro, porque fica a dúvida sobre a culpa do suspeito. Ele pode ser um inocente, injustamente acusado. Segundo, porque um bandido pode estar à solta, quem sabe praticando os mesmos crimes dos quais é acusado. Os erros judiciais em julgamentos são raros, mas a demora nas decisões também pode ser considerada como falha da Justiça. Sem entrar no mérito de cada caso, cinco ex-deputados denunciados pela CPI dos Sanguessugas como envolvidos com a Máfia das Ambulâncias estarão de volta ao mandato parlamentar em fevereiro próximo. Eles respondem a processo na Justiça Federal, mas não foram levados a julgamento. Também deixaram a Câmara sem serem julgados pelos colegas, no plenário da Casa. Ao regressarem, deverá ser aberto novo processo no Conselho de Ética, um órgão que tem sido moroso nas suas decisões. Os processos judiciais terão agora foro privilegiado: o Supremo Tribunal Federal (STF), que raramente condena políticos.

Lei para inocentes
É evidente que a culpa por tanta demora não é apenas do Judiciário. Esse poder queixou-se durante anos, com razão, da falta de estrutura física. Mas houve uma recuperação nos últimos quatro anos, com a destinação de R$ 1,6 bilhão do Orçamento da União para construção de prédios, reformas, e implantação de projetos que visam a melhoria processual. Só a implantação do Sistema Integrado de Gestão da Informação Jurisdicional consumiu R$ 570 milhões. Mesmo a construção de sedes das diferentes áreas da Justiça, muitas vezes criticada, objetiva a agilidade dos serviços e o melhor atendimento do público. É claro que, às vezes, os tribunais exageram no luxo de seus prédios, algo inadequado a um país que tem milhões de pessoas sem casa própria.

Parte do problema decorre da desatualização dos códigos de processo civil e criminal. Há uma infinidade de recursos, com prazos enormes, que possibilitam arrastar durante anos um processo. O novo Código de Processo Civil já está para ser votado no Congresso Nacional. Ele procura agilizar a tramitação dos processos, sem ferir o direito constitucional de ampla defesa. Para se ter uma idéia da defasagem do atual código, basta lembrar que ele foi aprovado em 1973.

Como bem lembrou o ex-ministro da Justiça Saulo Ramos, em entrevista concedida em janeiro do ano passado à revista Veja, a lei se preocupa só com os inocentes. “O problema é que a legislação brasileira parece feita só para inocentes. Os constituintes olharam para o passado, não para o futuro: fizeram vários artigos para defender os presos políticos das masmorras da ditadura”, disse o ex-ministro do governo Sarney. O problema é que os advogados dos culpados sabem utilizar muito bem os instrumentos da lei criados para proteger os inocentes. Que o diga o jornalista Pimenta Neves, réu confesso condenado em primeira instância pelo assassinato da jornalista Sandra Gomide, mas ainda em liberdade.

Governadores protestam contra PEC dos policiais

O Globo
24/11/2010
Autor(es): Agencia o Globo/ Cristiane Jungblut e Isabel Braga

Governadores e ministros fizeram ontem apelo para que a Câmara não vote agora a PEC 300, que cria um piso nacional para policiais civis e militares. O ministro Paulo Bernardo (Planejamento) avisou que a medida terá impacto de R$43 bilhões/ano para União e estados. Os líderes avisaram que há pressão de deputados e setor para que a PEC seja votada. O impasse pode inviabilizar a votação de dois outros pleitos dos governadores: o projeto que prorroga mecanismos da Lei Kandir e a PEC que prorroga o Fundo Nacional de Combate à Pobreza.

As questões foram debatidas em reunião com o presidente da Câmara e vice-presidente eleito, Michel Temer (PMDB-SP); dois ministros; sete governadores ou vices eleitos; e parlamentares.

Os governadores sugeriram encontro com a presidente eleita, Dilma Rousseff. O deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP) avisou que o PDT colocará a PEC 300 em votação se houver sessões extraordinárias para votar projetos de interesse dos governadores. Outra manifestação causou desconforto no Planalto: o líder do PMDB, Henrique Eduardo Alves (RN), falando em nome do "blocão" (que poderá reunir 202 deputados), avisou que seria difícil conter os deputados, porque houve compromisso em votar a PEC 300.

O governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), disse que os pisos nacionais ferem a autonomia dos estados:

- Se for criar piso nacional de uma, dez, 50 categorias, daqui a pouco os governadores terão cerceado seu direito de fazer a administração de pessoal. Se for por aí, entramos num caos.

O governador eleito de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), completou:

- Isso deve ficar para 2011.

- Queremos entregar à presidente Dilma um orçamento responsável - acrescentou o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha.

Ontem, manifestantes estiveram na Câmara para pressionar pela votação. Presidente da Associação Nacional dos Ativos e Inativos da Polícia Militar do Brasil, o coronel Adalberto Rabelo disse que, se a emenda não for votada este ano, os policiais farão movimento reivindicatório no dia da posse de Dilma.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Conselho cancela cobrança de juros sobre multa

Valor Econômicoo
Legislação & Tributos
18 de novembro de 2010

O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) - órgão pelo qual o contribuinte discute procedimentos fiscais - mudou de entendimento sobre a incidência de juros nas multas de ofício aplicadas pela Receita Federal. Em sessão realizada na semana passada, os conselheiros da 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais do órgão decidiram, por seis votos a quatro, que o Fisco não pode realizar tal cobrança.

A mudança de entendimento representa para os contribuintes uma redução drástica nos valores das autuações fiscais, pois os juros incidem em multas cujos percentuais de 75% ou 150% - a depender da infração - recaem sobre o valor do tributo cobrado.

O caso analisado pelo Conselho é de uma empresa de Minas Gerais, que trata da omissão de rendimentos na declaração do Imposto de Renda. O contribuinte foi autuado e, dentre outros pontos do processo administrativo, contestava a cobrança de juros sobre a multa.

O advogado Júlio de Oliveira, sócio do Machado Associados, afirma que, no início deste ano, o Carf julgou a mesma questão, mas entendeu justamente o contrário. Na época, a mesma 1ª Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais entendeu que a multa de ofício, correspondente a 75% do valor do débito cobrado pela União do contribuinte, deveria ser corrigida com juros.

Segundo o advogado, porém, não existe previsão legal para essa cobrança. Ele afirma que os juros remuneram o capital que está indevidamente retido com alguém. A multa é uma pena por ter deixado de cumprir uma obrigação na data correta.

Segundo o tributarista Eduardo Fleury, o entendimento da Receita Federal é recente, algo de cinco anos para cá. A tese, como afirma, surgiu com a Lei nº 9.430, de 1996 - que instituiu a taxa Selic. A partir dessa norma, , afirma Fleury, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) trouxe essa nova interpretação. De acordo com ele, porém, a lei é clara ao determinar que os juros só incidem sobre o principal.

O coordenador da atuação da PGFN no Carf, Paulo Riscado, afirma que, ao contrário do contribuinte, a Fazenda entende que o parágrafo 3º, do artigo 61 da Lei nº 9.430, ao se referir aos juros que incidem sobre os débitos com a União, incluiria o tributo e a multa. "A multa também é um débito com a União", afirma. Segundo ele, entender o inverso seria promover o enriquecimento sem causa da outra parte.

Riscado afirma que há divergência entre as turmas da Câmara Superior de Recursos Fiscais e, por esse motivo, a PGFN estuda a possibilidade de levar o tema para o Pleno do Carf, que dará a palavra final sobre a questão.

Zínia Baeta - De São Paulo

Servidores do Judiciário iniciam greve em 7 Estados

Folha de São Paulo
18 de novembro de 2010
Servidores do Judiciário Federal em sete Estados decidiram ontem entrar em greve por tempo indeterminado para pressionar o governo a negociar os recursos para a aprovação de plano de cargos e salários da categoria.

Em cinco Estados -RS, MT, BA, AL e ES-, a paralisação atinge todos os ramos do da Justiça: Federal, Eleitoral e do Trabalho. No Amazonas e nas regiões de Campinas e Ribeirão Preto, no interior de São Paulo, a greve atinge apenas a Justiça do Trabalho.

No Rio de Janeiro, os servidores decidiram começar greve por tempo indeterminado a partir da quinta-feira da semana que vem.

O dia de ontem também foi marcado por paralisações de 24 horas em todo o Judiciário Federal de Minais Gerais e de São Paulo. Nos dois Estados, os servidores marcaram novas paralisações para a semana que vem com o intuito de fortalecer o movimento e tentar mobilizar a categoria para a realização de greve.

Outros oito Estados -SC, MA, RJ, PE, PI, PA, MS e PR- tiveram atos menores, todos com o objetivo de mobilizar as categorias a aderir a uma paralisação nacional.

"Queremos forçar o governo a dar encaminhamento aos projetos de lei que tratam dos aumentos. Estamos mobilizados por uma participação mais efetiva que possibilite a deflagração da greve", diz José Carlos de Oliveira, coordenador-geral da Fenajufe (federação dos servidores do judiciário federal).

O plano de cargos e salários significaria um aumento médio de 56% nos ganhos dos servidores. Estima-se que o reajuste teria um impacto de R$ 7,2 bilhões ao ano para o Judiciário.

O presidente do STF, Cezar Peluso, já disse publicamente ser favorável ao plano. No entanto, o ministro Paulo Bernardo (Planejamento), chamou de "delirante" o aumento pretendido.

FERNANDO GALLO
DE SÃO PAULO

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Substituição gera prejuízo de R$ 1,7 bi

Valor Econômico
09 de novembro de 2010

As micros e pequenas empresas perderam R$ 1,7 bilhão em 2008 por causa da substituição tributária do ICMS. É o que mostra uma pesquisa encomendada pelo Sebrae à Fundação Getúlio Vargas (FGV) sobre o impacto desse sistema de tributação, aplicado a diversos setores econômicos. O modelo gerou um aumento de 700% na carga fiscal dos pequenos empresários, segundo o levantamento.

Pela substituição tributária, uma única empresa recolhe o ICMS antecipadamente por toda a cadeia de produção. Assim, a Fazenda estadual só precisa fiscalizar o chamado "substituto tributário". A pesquisa completa será divulgada hoje no seminário "Reforma Tributária Viável: Desafios do ICMS Rumo ao Desenvolvimento Nacional", promovido pelo Sebrae e o Núcleo de Estudos Fiscais (NEF) da Direito GV.

O levantamento foi realizado a partir de informações da Declaração Anual do Simples Nacional de 2009, ano-calendário 2008, ano em que diversos setores econômicos passaram a se sujeitar à substituição tributária. O resultado reforça o argumento das micros e pequenas empresas contra a bitributação. Isso porque já pagam o ICMS embutido na alíquota única do Supersimples e, com a substituição tributária, passaram também a ter que antecipar o ICMS da cadeia inteira.

De acordo com a pesquisa, 24% do total das receitas com revendas de mercadorias dessas empresas são sujeitas à substituição tributária. Em São Paulo, por exemplo, R$ 952,22 milhões são pagos por substituição tributária pelas micros e pequenas, enquanto R$ 458,48 milhões são pagos de ICMS por meio do Supersimples. Isso quer dizer que elas pagam R$ 493,74 milhões a mais de ICMS - antecipação - em nome das outras empresas da cadeia produtiva. Em sua campanha, o governador eleito Geraldo Alckmin (PSDB-SP) defendeu o uso da substituição tributária no combate à sonegação. Porém, prometeu estudar meios para aperfeiçoar o sistema.

Para o Sebrae, a substituição tributária acaba lesando quem está no Supersimples. Segundo André Spínola, gerente-adjunto da Unidade de Políticas Públicas do Sebrae, uma fábrica de pão de queijo, que é substituto tributário, paga antecipadamente um grande valor de ICMS pela cadeia produtiva. O hipermercado a quem fornece a mercadoria, no entanto, só paga pelos pães de queijo sessenta dias depois. "A substituição tributária, portanto, acaba criando uma situação esdrúxula, em que o grande é financiado pelo pequeno", afirma.

Duas exceções são Pará e Santa Catarina que, de acordo com Spínola, criaram mecanismos que atenuam os efeitos da substituição tributária para as pequenas empresas. "Em Santa Catarina, há um redutor da base de cálculo do imposto de 70%. No Pará, excluíram as micros e pequenas da aplicação do sistema", diz.

Há casos de pequenas empresas que discutem a aplicação da substituição tributária na Justiça. Mas nem sempre conseguem derrubar o modelo. Isso porque a Lei do Supersimples - nº 123, de 2006 - determina que o ICMS da substituição tributária deve ser pago. Na revenda, a micro deve aplicar a alíquota do Supersimples, abatendo a parcela correspondente à substituição tributária. Segundo o advogado Fábio Junqueira, do JCMB Advogados, há decisões esclarecendo que, como o Supersimples é optativo, as pequenas atingidas pela substituição tributária podem optar por abandonar o regime simplificado de tributação.

Laura Ignacio - De São Paulo

Indústria teme que lei paulista gere nova guerra fiscal

Valor Econômico - Brasil
17 de novembro de 2010

As leis estaduais sobre mudança climática podem criar uma guerra ambiental entre Estados, atraindo ou afastando indústrias. Empresários paulistas temem que a lei do Estado de São Paulo, a única entre as nove existentes hoje que coloca uma meta obrigatória de corte de emissões de CO2, possa repetir a guerra fiscal em molde ambiental.

"Aquilo que nos motivou, e foi feito de forma bem-intencionada, pode no futuro próximo se reverter contra os interesses do Estado de São Paulo", disse Carlos Cavalcanti, diretor titular do departamento de infraestrutura e energia da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) ontem, durante seminário. "Pode ocorrer uma guerra entre Estados baseada na legislação climática", reforçou o executivo, durante o seminário "Mudança do Clima e Competitividade na Indústria", promovido pela Fiesp na capital paulista.

Cavalcanti se referia à Política Estadual de Mudanças Climáticas, a Lei nº 13.798, de novembro de 2009, regulamentada por decreto em junho. Foi a primeira e única a estabelecer metas obrigatórias de corte do dióxido de carbono em 20% em 2020 em relação a 2005. Ele também se queixou de falta de participação do empresariado no processo e de que ainda não há inventário oficial das emissões do Estado - que deve sair este mês. "Fizeram a lei antes de conhecer o problema", reclama. "É como se um médico dissesse ao paciente que ele tem que emagrecer 20 quilos sem pesá-lo antes."

"Não precisa conhecer as emissões do Estado até a terceira casa decimal para que se façam políticas públicas", rebate Oswaldo Lucon, assessor para questões de mudança climática do gabinete do secretário de Meio Ambiente. Tanto Lucon quanto Cavalcanti concordam que o setor energético é o maior responsável pelas emissões paulistas, aqui incluídos transporte, indústria, residências, comércio e serviços. Segundo Lucon, em 2006 a Secretaria de Energia do Estado publicou as emissões do setor referentes a 2005 (cerca de 70 milhões de toneladas de CO2 equivalente), e o dado, embora possa ser superior agora, não fugirá muito desse valor. "Quando o Protocolo de Kyoto foi assinado, as emissões dos países desenvolvidos não eram conhecidas", exemplificou. Mas ele diz que "é legítimo" o temor da indústria de que as metas de São Paulo sejam setoriais. "A lei abre essa possibilidade, mas isto não está em estudos", adianta.

Os empresários poderiam temer a forma como os cortes setoriais poderiam ser definidos - atingindo, por exemplo, indústrias enxutas, que não têm onde reduzir. Lucon lembra que o momento é de governo de transição e que ele fala apenas como um dos técnicos mais envolvidos no tema. "O argumento da guerra ambiental é recorrente", prossegue. "A indústria tem toda a liberdade de ir para onde for melhor. Se houver paraísos lenientes em relação às emissões, é decisão de cada empresário." Ele lembra que a Califórnia tem leis ambientais rigorosas e indústrias de ponta e de inovação. "Queremos atrair para São Paulo investimentos de alto valor agregado e baixas emissões."

Na interface entre o comércio internacional e as negociações climáticas, Carlos Márcio Bicalho Cozendey, diretor do Departamento Econômico do Ministério das Relações Exteriores alertou a plateia para uma "questão subjacente". Explicou: "Por trás da maior parte das medidas há uma importante discussão de metodologia". Ou seja, quando se fala qual a taxa de carbono de um produto agrícola, ou do sequestro de carbono de um pasto, por exemplo, utilizam-se metodologias desenvolvidas nos países industrializados, com bancos de dados de agricultura em zonas temperadas, "que é muito diferente de um pasto que cresceu em zona tropical." Para corrigir as distorções, só há uma saída, recomendou: investir no banco de dados, nas metodologias, e acompanhar o que está ocorrendo no exterior.

Rodrigo Lima, gerente-geral do Instituto de Estudos do Comércio e Negociações Internacionais (Icone), lembrou que, no caso das emissões nacionais, se o Brasil conseguir controlar o desmatamento, a bola da vez fica com a agricultura, setor que responde por 18,9% das emissões nacionais. O uso de fertilizantes, por exemplo, provoca a emissão de gás metano e óxido nitroso, dois poderosos gases-estufa. "Há uma discussão técnica, de reavaliação do peso desses dois gases-estufa, que é preciso acompanhar", aconselhou. Pela metodologia atual adotada internacionalmente, o metano é 21 vezes mais agressivo que o CO2 e o óxido nitroso, 310 vezes. A revisão desses dados coloca o metano como 5 vezes mais danoso e o outro, 270 vezes. Isso significa que as emissões do setor deixariam de representar 18,9% das emissões do Brasil e, pelo artifício contábil, seriam 10,2%.

Os empresários temem que o tratado climático internacional que as Nações Unidas procuram costurar tenha medidas protecionistas embutidas. A Fiesp lançou ontem suas posições para a próxima rodada de negociações, este mês, em Cancún, no México.

Daniela Chiaretti - De São Paulo

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O TJSP e os cargos de confiança

Jornal O Estado de S. Paulo
16/11/2010

No final da campanha eleitoral, passou praticamente despercebida a aprovação, pela Comissão de Constituição e Justiça da Assembleia Legislativa de São Paulo, do projeto de lei que cria 2.199 cargos em comissão para assistentes de juízes de primeiro grau. O projeto, de autoria do presidente do Tribunal de Justiça (TJ), desembargador Viana Santos, é bastante polêmico.

Com 45 mil funcionários, a Justiça paulista é a maior do País. Totalizando R$ 4,3 bilhões, a folha de pagamentos de ativos e inativos já consome 90% do orçamento anual da instituição. Se for autorizada pela Assembleia, a contratação de 2.199 comissionados aumentará em 5% o quadro de servidores. Para o desembargador Viana Santos, isso vai agilizar a tramitação das ações, desafogando as instâncias inferiores da Justiça. Segundo ele, os juízes de primeira instância não dispõem de "uma estrutura à altura de suas atribuições".

A proposta do presidente do TJSP conta com o apoio da Associação Paulista de Magistrados (Apamagis). Segundo o presidente da entidade, desembargador Paulo Dimas, cada juiz poderia indicar um assistente, tendo a liberdade de escolher profissionais de dentro ou de fora da carreira judicial, com base em avaliação de currículo ou testes. "A ideia é trazer alguém de confiança para somar e produzir. O comissionado não vai fazer produção burocrática, mas dar apoio diferenciado ao magistrado, que precisa ter uma estrutura maior de trabalho para vencer os processos."

Apesar desses argumentos, a proposta está sendo duramente criticada nos meios jurídicos e governamentais. No âmbito do Executivo, as principais críticas são de que o projeto enviado pelo TJSP para a Assembleia Legislativa representa um retrocesso, pois vai na contramão das políticas de profissionalização e aperfeiçoamento da administração direta. Partindo da premissa de que os cargos de livre indicação permitem o ingresso de servidores despreparados na máquina governamental, além de favorecerem o apadrinhamento, o clientelismo e o fisiologismo, a política de profissionalização tem por objetivo substituir os servidores comissionados por funcionários selecionados por concurso público de provas e títulos.

Nos meios jurídicos, a principal crítica é de que o projeto colide com a Resolução n.º 88 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o órgão encarregado de promover o controle externo do Poder Judiciário. A medida foi baixada em setembro do ano passado, em meio a uma série de providências moralizadoras tomadas para acabar com o nepotismo, e estabeleceu regras rigorosas para o preenchimento dos cargos em comissão nos tribunais e para a requisição de funcionários. Entre outras restrições, a Resolução n.º 88 determinou que pelo menos 50% dos cargos comissionados na Justiça devem ser obrigatoriamente destinados a servidores de carreira, selecionados por meio de concursos públicos. O projeto que está na Assembleia Legislativa passa por cima dessa proibição.

Confirmando que se trata de um retrocesso institucional, a proposta do TJSP favorece o compadrio. Os serventuários judiciais concursados são, evidentemente, selecionados pelo critério do mérito, mas, por isso, não são considerados de "confiança" pelos desembargadores paulistas. Como disse o presidente da Apamagis, eles não teriam como dar "apoio diferenciado" aos magistrados. Daí o projeto que, invocando o critério da "confiança", volta a abrir caminho para a contratação de parentes e apadrinhados, como era comum em todos os tribunais antes das medidas tomadas pelo CNJ para acabar com o nepotismo no Judiciário. Nos dois últimos meses, a corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, já concedeu várias entrevistas criticando duramente o corporativismo de juízes e denunciando a tentativa de alguns setores da magistratura de solapar essas medidas.

O TJSP está pressionando a Assembleia Legislativa a aprovar o projeto ainda este ano. Vamos esperar que os deputados não cedam às pressões. Pelo bem do próprio Poder Judiciário.

Fonte:
Clipping Seleção de Notícias
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Com "extras", os 26 Estados cumprem piso para professor

Autor(es): Luciano Máximo
Valor Econômico
12/11/2010

Dois anos após entrar em vigor, a Lei 11.738, que instituiu o piso nacional dos professores da educação básica, fixado hoje em R$ 1.024, ainda gera polêmica. Desde a aprovação da legislação, muitos Estados criaram planos salariais para se enquadrar na lei. Pelo entendimento acatado em liminar concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), todos eles mais o Distrito Federal cumprem a regra em relação à maioria dos docentes das redes estaduais, que são aqueles com diploma universitário. Já na avaliação da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), pelo menos três Estados precisam somar o vencimento básico com uma série de gratificações - vantagens comuns na folha de pagamento do magistério público - para cumprir o piso. E outros o descumprem para professores sem curso superior.

Apesar de contestada pelos sindicatos, a prática de somar gratificações ao piso para alcançar o valor de R$ 1.024 é legal, segundo liminar do STF concedida em 2008 à ação direta de inconstitucionalidade de cinco governadores (RS, SC, PR, MS e CE). Para a CNTE, o piso deve ser composto apenas pelo vencimento básico. "É assim que a lei foi aprovada originalmente, por isso trabalhamos com a lógica de que poucos Estados e municípios a cumprem. Existem divergências sobre o valor pago, que não é o salário-base. A ação dos governadores causou uma grande celeuma, que só atrasa avanços nos projetos de valorização e carreira do magistério", conta Roberto Leão, presidente da entidade.

O vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários Estaduais de Educação (Consed), Haroldo Corrêa Rocha, disse ao Valor que, apesar das dificuldades, todos os Estados conseguiram ficar dentro da lei, mas não abriram mão das gratificações como componente do piso salarial. "Os "penduricalhos" são frutos do Brasil inflacionário. Sempre que havia pressões criava-se uma gratificação para o salário do professor não perder valor. Ainda há muitos servidores com essas vantagens, mas os novos chegam com composições salariais mais simples, graças aos planos formulados pelos Estados", explica Rocha, que também é secretário estadual de Educação do Espírito Santo.

Excluídos os tradicionais "penduricalhos" da folha de pagamento do magistério, a CNTE insiste em afirmar que o salário-base de professores com licenciatura de Minas Gerais, Santa Catarina e Rio Grande do Sul é inferior aos R$ 1.024 estipulados pela lei. No caso de docentes que apenas concluíram o ensino médio - minoria na rede estadual -, a maioria dos governos estaduais precisa complementar o vencimento básico para cumprir o piso salarial. "Por exigência da LDB [Lei de Diretrizes e Bases da Educação Básica, de 1996], o professor com curso de normalista está em extinção. Quando a lei foi implementada, em 2008, apenas 16 servidores estavam nessa condição na rede estadual do Espírito Santo, que tem hoje 26 mil docentes", complementa Rocha.

Elizete Mello, diretora de desenvolvimento humano da Secretaria Estadual da Educação de Santa Catarina, explica que, com regências de classe e outras vantagens, a remuneração do professor chega a R$ 1.024 ou supera o piso. "O STF entende como valor-base a soma das remunerações, logo o piso passa a ser a remuneração final. A CNTE diz o que quer", argumenta Elizete. Segundo ela, o atual governo catarinense espera a transição pós-eleição para definir nova política de cargos e salários para o magistério público.

Em Minas Gerais, esse planejamento já foi definido e entra em vigor a partir de janeiro do ano que vem. A adoção do pagamento por subsídio no Estado vai unificar a remuneração de 200 mil professores e pôr fim aos "penduricalhos", que, em alguns casos, ocupam mais de 20 itens do contracheque do professor. Segundo João Antonio Filocre, secretário-adjunto da Educação, a reformulação salarial da carreira docente no Estado vai reduzir as atuais distorções da folha de pagamento do magistério mineiro. "Para servidores com mais de 20 anos de carreira, o vencimento básico representa 37% da remuneração, enquanto para os mais novos é de 54%. O novo modelo poderá reduzir essa distância ao vincular a remuneração a uma parcela única na remuneração."

Segundo Filocre, a unificação de diferentes vantagens salariais na educação já funciona no Espírito Santo, Mato Grosso e Maranhão e em várias carreiras federais. O impacto da reforma salarial no Orçamento de Minas Gerais será de R$ 1,3 bilhão por ano. "Todos os servidores ganharão um reajuste de pelo menos 5% no processo. O professor com nível superior terá salário médio para início de carreira de R$ 1.650, para jornada semanal de 30 horas."

No Rio Grande do Sul, onde o piso só é cumprido com a soma de salário-base e gratificações, uma reforma salarial na educação foi barrada pela Assembleia Legislativa este ano. "Em função da lei do piso, o Executivo propôs a uniformização dos salários de professores para R$ 1.500, mas a medida não passou por causa do período eleitoral", informou a assessoria de imprensa da Secretaria Estadual da Educação.

Na avaliação de Cláudia Cruz, superintendente de recursos humanos da Secretaria Estadual da Educação da Bahia, o excesso de vantagens contidas no contracheque dos professores brasileiros contribui para "diferentes interpretações sobre o que é piso e o que é remuneração". Lei estadual do ano passado corrigiu os salários na área de educação e estabeleceu apenas uma gratificação fixa. "A referência da lei do piso é um vencimento básico de R$ 1.308, mais 31,18% de vantagem de estímulo à atividade docente. Outras gratificações são variáveis", comenta.

De acordo com apuração do Valor, Ceará, Pará, Sergipe, Paraíba, Acre, Alagoas e Pernambuco, além do Mato Grosso, Espírito Santo e Maranhão, também criaram leis para ajustar os salários dos professores da rede pública à lei do piso, que prevê reformulação dos modelos salariais. "Se o Supremo decidir desconsiderar a atual regra de remuneração do piso, nós não seremos pegos de surpresa nem obrigados a correr para reajustar salários e comprometer o Orçamento do Estado", diz Cláudia.

Fonte:
Clipping Seleção de Notícias
Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

terça-feira, 9 de novembro de 2010

STF julgará concessão de benefícios sobre ICMS

VALOR ECONÔMICO - LEGISLAÇÃO & TRIBUTO

O Supremo Tribunal Federal (STF) vai analisar uma ação proposta pelo governo do Distrito Federal que pede a reformulação na forma de aprovação da concessão de benefícios fiscais relativos ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Desde 1975, os benefícios fiscais precisam ser aprovados em reuniões do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz) de forma unânime por todos os Estados. O Distrito Federal tenta, na arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF), fazer com que os benefícios sejam aprovados apenas pela maioria dos Estados. Tributaristas acreditam que caso a ação seja julgada procedente, a mudança pode atenuar a guerra fiscal entre os Estados.

A norma questionada - Lei Complementar nº 24, de 1975, - dispõe sobre a concessão de isenções referentes ao ICMS. A lei determina que os convênios serão celebrados em reuniões com representantes de todos os Estados e do Distrito Federal e que a concessão dependerá sempre da aprovação unânime de todos os Estados. Já a revogação dos benefícios depende da aprovação de quatro quintos dos representantes estaduais. A procuradoria do Distrito Federal argumenta na ação que a lei contraria o princípio democrático de aprovação por maioria, pois a Constituição não exige unanimidade para a aprovação de qualquer dos diplomas legais.

Para a procuradoria, a norma não teria sido recepcionada pela Constituição Federal. "A exigência da unanimidade não é adequada para o alcance do objetivo final da norma, que é desestimular a guerra fiscal", diz a petição assinada pelo procurador-geral do Distrito Federal Marcelo Lavocat Galvão. Segunda a argumentação, "não é razoável que num país em que as desigualdades regionais são reconhecidas pela própria Constituição, exigir a unanimidade para a concessão de benefícios fiscais".

O Distrito Federal tentou obter uma liminar para suspender os artigos que determinam a aprovação unânime, mas o pedido foi negado pelo relator da ação no Supremo, ministro Dias Toffoli. O Ministério Público Federal (MPF) se manifestou na ação de forma contrária à tese do Distrito Federal. De acordo com o parecer do órgão, o peso atribuído a todos os Estados é igual, para que não se alegue a concessão de poder a um ente da federação em detrimento dos demais. Para o MPF, a lei de 1975 tem por objetivo evitar medidas ilegítimas feitas pelos Estados para atrair investimentos internos e externos, e a unanimidade evita concessão de benefícios unilaterais que causam a guerra fiscal.

Na avaliação de tributaristas, caso o Supremo aceite o pedido do Distrito Federal, a guerra fiscal travada hoje entre os Estados pode ser amenizada. Para o advogado João Rafael Gândara, do Pinheiro Neto Advogados, por ser uma norma rígida, os Estados a desobedecem e fazem acordos unilaterais para atrair investimentos. "A mudança pode significar ainda mais segurança para o contribuinte, que é atraído para alguns Estados com a promessa de benefícios fiscais de um governo e acaba refém da troca de governos", diz Gândara.

De acordo com Jacques Veloso de Melo, sócio do escritório de Advocacia Fernandes Melo, quase todos os Estados possuem normas de incentivo ao setor produtivo que foram implementadas sem a aprovação do Confaz. "A aprovação por maioria colocaria um fim na guerra fiscal, pois seria possível o debate entre os Estados e a aprovação de todas as normas que objetivem o desenvolvimento regional", diz Melo. Na opinião dele, a guerra fiscal é fruto da reação dos Estados aos vetos.

Luiza de Carvalho - De Brasília

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

O Supremo em débito

Autor: Aloísio de Toledo César
O Estado de S. Paulo 
08/11/2010


Não é nada agradável ter de dizer isto, mas o Supremo Tribunal Federal (STF) ficou devendo ao País uma decisão menos vacilante a respeito da lei que impede a candidatura de políticos qualificados como "fichas-sujas". Ao empacar num empate por 5 votos a 5 e delegar a um tribunal inferior - o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) - a competência para decidir a questão, os ministros do Supremo se desvalorizaram perante os olhos de todos os que aguardavam uma posição mais firme. Enfim, como Pilatos, lavaram as mãos.


Quando esse órgão máximo da Justiça brasileira, guardião carimbado da Constituição federal, vacila diante de uma lei que admitiu a ilegalidade de condutas que nenhuma lei anterior qualificava como ilegais, resta a conclusão de que boa parte da garantia dos cidadãos foi por água abaixo.

Enfim, a partir desse vazio, e do péssimo exemplo, qualquer comportamento atualmente tido como regular poderá no futuro ser admitido como criminoso por lei posterior que assim disponha.

Agir dessa forma, ou seja, admitir que uma lei retroaja para prejudicar, ao invés de beneficiar, o Supremo Tribunal externou desprezo ao princípio constitucional, universalmente aceito, de que ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa a não ser em virtude de lei, e que está na raiz de existência do próprio Supremo Tribunal Federal.

Tal disposição, denominada princípio da legalidade, não poderia ser ignorada no caso dos "fichas-sujas", porque está expressa na Constituição federal e dá suporte praticamente a todo o arcabouço jurídico do País.

Sabidamente, o princípio da irretroatividade das leis é também princípio constitucional complementar ao da legalidade, porque permitir retroação significa - como se viu no caso dos "fichas-sujas" - considerar irregulares, ilegais ou criminosos fatos que não estavam submetidos a norma legal alguma quando foram praticados.

O artigo 5.º, XXXIX, da Constituição federal, dispõe que não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal. Isso vem desde os primórdios do Direito romano, pelo brocardo nullum crimen nulla poena sine lege (não há crime nem pena sem lei preexistente), que atravessou os séculos e constitui garantia e direito subjetivo de qualquer cidadão.

O Supremo Tribunal Federal, ao examinar a questão, teve comportamento escorregadio, que levou em conta, quem sabe, orgulho e vaidades pessoais, que resultaram em esquecer o que mais importava: o respeito à Constituição e às leis.

A chamada Lei da Ficha Limpa é bem-vinda e poderia representar um avanço no processo democrático do País, não fosse a decisão contrária ao Direito de permitir que tenha eficácia anteriormente à data da publicação. O comportamento do Supremo Tribunal Federal impôs um buraco negro na vida legislativa do País, ou seja, deixou-nos diante de um retrocesso no Estado de Direito.

A interpretação forçada de que não se trata de retroação da lei, mas de simples indeferimento de candidaturas de políticos com passado não recomendável, equivaleu a negar vigência a princípios constitucionais de extrema relevância, que não poderiam ser ignorados.

O indeferimento de candidaturas de políticos ligados à corrupção ou a comportamentos inadequados é algo para ser recebido com festa e champanhe, mas não nas circunstâncias atuais, que considerou criminosas ou infratoras determinadas condutas que nenhuma lei definia como inadequadas na época de sua prática.

Afastar tais políticos por essa forma deveria ser motivo de alegria, não do luto decorrente de estarem desmoronando princípios constitucionais que são a garantia de qualquer brasileiro.

O pior é que restou a ideia de que houve submissão judicial aos anseios da população, compreensivelmente engajada na luta para afastar os "fichas-sujas". Não se pode compreender que juízes julguem ao sabor dos ventos, porque estes mudam de direção a toda hora. Juízes não assumem suas funções para agradar ou desagradar, mas para dizer o direito que emerge da Constituição e das leis.

Essa má impressão, que é pública, alcançou os diferentes Tribunais Regionais Eleitorais do País e o próprio Tribunal Superior Eleitoral, cujos juízes acabaram afrouxando o rigor e a lucidez, que deveriam ser marca registrada da magistratura.

Em verdade, restou a ideia de que houve um esforço nada jurídico para agradar e com isso permitir que tivesse eficácia uma lei não a partir de sua publicação, mas com inconstitucional retroação. Esse é um erro muito grave, não quanto ao espírito da lei, que é ótima, mas pela condescendência que se fez, criando um precedente perigoso.

É pacífico o entendimento de que a definição legal de crime ou de simples infração administrativa, assim como a previsão de pena ou de sanção, hão de preceder o fato tido como delituoso.

Sem lei anterior que tenha assim disposto, torna-se realmente incômodo observar que o Supremo Tribunal Federal e os tribunais eleitorais indeferiram o registro de candidaturas de políticos cuja conduta não era considerada irregular por lei à época em que foi praticada.

Não é o caso de defender esses políticos ou a sua conduta. O que se deve defender é a impossibilidade de serem punidos por fatos que não estavam previstos em lei no momento de sua prática, uma vez que a violação desses princípios representa uma perda para cada um de nós, principalmente os que amam o Direito.

Lembrando Por Quem os Sinos Dobram, de Ernest Hemingway, forçoso é concluir: se vierem a dobrar, não será para festejar a lei "ficha-suja", mas para tornar patente o que cada um de nós perdeu com isso.